Somos todos responsáveis pelas mudanças climáticas

em 4 May, 2019


entrevista

Diante das mudanças climáticas e seus efeitos danosos no Planeta, os esforços em conjunto em busca de solução são da sociedade, empresas e governo “tendo como base a certeza de que não devemos continuar agindo como de costume”, alerta a professora Isabel Grimm.

Para a especialista, a mudança climática não é tema novo, ela sempre existiu. “Entretanto, a ação humana no ambiente intensificou essas mudanças tendo, entre outras causas, o uso dos combustíveis fósseis”, ressalta.

Isabel Grimm atualmente é professora na área de mestrado da ISAE (Instituto Superior de Administração e Economia), com Pós-doutorado em Gestão Urbana, pela PUC-PR e doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento, pela UF-PR.

Na avaliação da entrevistada, os efeitos negativos resultantes das mudanças climáticas provocam prejuízos a todos os povos, mesmo entre aqueles que menos provocam as emissões de gases de efeito estufa, ao passo que os maiores responsáveis pelas emissões serão os que menos terão de sofrer as consequências.

Dentro desse amplo problema, a redução dos efeitos climáticos reside “no consenso e na transferência de conhecimento para a mitigação e para a adaptação das populações em especial as economicamente vulneráveis”, na avaliação da professora.

Dessa maneira como determinar os custos a serem pagos para aqueles que menos poluem indaga a especialista. “Será essa a nova injustiça ambiental”, questiona.

Não temos mais tempo a perder, “a mudança climática poderá afetar os elementos básicos da vida no Planeta, acesso à água, produção de alimentos, saúde e meio ambiente, causando aumento de pressão sobre os recursos naturais aliados a grande urbanização, industrialização e desenvolvimento econômico”, alerta a especialista.

Nesse sentido, continuar debatendo as causas das mudanças climáticas e os responsáveis apenas atrasa uma “tomada de decisão no campo político sobre as ações concretas em relação ao real devedor/pagador”.

Um caminho para lidar com o problema seria “a implantação de políticas públicas, para além das fronteiras nacionais, que garantisse a criação de mecanismo de pagamento e critérios de redução certificadas de emissões de gases de efeito estufa, “recompensando” populações mais atingidas pelos impactos negativos das mudanças climáticas. Todavia, isso exige muito estudo no campo da governança climática”, um grande desafio a ser enfrentado. Veja a entrevista que Isabel Grimm, concedeu, por e-mail, ao Observatório Eco, com exclusividade.

Observatório Eco: Como você avalia o tema das questões climáticas ser debatido no âmbito do Judiciário americano. É pertinente as cidades que sofrem os efeitos das mudanças climáticas, a elevação do nível dos mares, processarem as companhias de petróleo?

Isabel Grimm: A mudança climática não é tema novo, ela sempre existiu. Entretanto, a ação humana no ambiente intensificou essas mudanças tendo, entre outras causas, o uso dos combustíveis fósseis. É notório que as sociedades já enfrentam e outras deverão enfrentar os efeitos deletérios das mudanças climáticas, porém atribuir a culpa em relação aos danos causados pelos fenômenos extremos (secas, enchentes, aquecimento dos oceanos etc.,), a um único segmento poderá onerar o cidadão da sua responsabilidade de mitigação.

Todos detêm parcela de responsabilidade ao serem tributários, fazendo uso do combustível fóssil, seja da forma que for. A questão reside no consenso e na transferência de conhecimento para a mitigação e para a adaptação das populações em especial as economicamente vulneráveis.

Observatório Eco: Afinal, essas companhias podem ser penalizadas por contribuírem com as mudanças climáticas? No âmbito científico essa alegação tem procedência?

Isabel Grimm: A ciência tem se preocupado em identificar causas e consequências das mudanças climática e como a sociedade contemporânea deve mitigar e se adaptar ao fenômeno.  Os efeitos negativos resultantes das mudanças climáticas provocam prejuízos a todos os povos, mesmo entre aqueles que menos provocam as emissões de gases de efeito estufa, ao passo que os maiores responsáveis pelas emissões serão os que menos terão de sofrer as consequências.

Como determinar os custos a serem pagos para aqueles que menos poluem? Será essa a nova injustiça ambiental? São essas questões que devem pautar o tema das mudanças climáticas nos próximos anos, não na área acadêmica e sim na política.

Observatório Eco: O fato dessas empresas terem conhecimento prévio desses impactos, mas encobrirem os estudos sobre o tema, como é alegado pelas cidades, deve ser avaliado de que maneira?

Isabel Grimm: A incerteza que pauta o tema das mudanças climáticas e o debate em prol ou em defesa de suas causas pode ofuscar a tomada de decisão no campo político sobre as ações concretas em relação ao real devedor/pagador.

Contudo, seria oportuno que a implantação de políticas públicas, para além das fronteiras nacionais, que garantisse a criação de mecanismo de pagamento e critérios de redução certificadas de emissões de gases de efeito estufa, “recompensando” populações mais atingidas pelos impactos negativos das mudanças climáticas. Todavia, isso exige muito estudo no campo da governança climática.

Observatório Eco: Quatro ONGs francesas estão processando o governo francês em razão das mudanças climáticas, alegando que o governo não está cumprindo com suas metas de diminuição de emissão dos gases de efeito estufa pactuadas no Acordo de Paris e em suas políticas nacionais. Qual a sua opinião sobre a propositura dessa ação?

Isabel Grimm: A ação da sociedade, representada também pelas ONGs, ocupa papel fundamental na mitigação das mudanças climáticas. Sendo assim, mecanismos legais podem, em tese, auxiliar na busca do cumprimento das ações propostas em acordos internacionais, e servir de instrumento para nortear a sociedade em busca de seus direitos. Porém, isso só acontecerá se nós, a população, pressionarmos de baixo para cima.

Observatório Eco: Em sua defesa, o governo francês alega que a responsabilidade pelas mudanças climáticas também é do cidadão e das empresas, além do governo e que uma demanda climática como essa é sem sentido. De que maneira podemos entender esse ambiente contraditório? De quem é a culpa pelas mudanças climáticas?

Isabel Grimm: Manifestadas em diversas escalas de tempo e em parâmetros como precipitações e temperatura, as mudanças climáticas se devem a causas naturais. Contudo, após a revolução industrial até a atualidade tem havido aumento significativo no uso de carbono (carvão mineral, petróleo, e gás natural), principalmente para geração de energia destinada à indústria e para uso veicular. Os combustíveis fósseis ao serem queimados liberam o dióxido de carbono (CO2) para atmosfera aumentando a sua propriedade de reter calor, sendo responsável por mais de 50% das emissões mundiais deste gás.

A atividade humana contribui para as concentrações atmosféricas de gases de efeito estufa de dióxido carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) que têm aumentado desde 1750, derivado principalmente de emissões de combustíveis fósseis e, secundariamente, da mudança do uso da terra. O resultado é um enorme volume gases contaminantes que são liberados na atmosfera, modificando a capa que retém o calor da Terra, intensificando o aquecimento e aumentando a temperatura global.

Opiniões divergem, e inúmeras incertezas, pautam o cenário acerca da contribuição antropogênica no aumento da temperatura média do planeta. Interesses econômicos, políticos e ambientais das mudanças climáticas aquecem a arena na disputa da ciência com a política.

Nesse momento, é cabível observar que as hipóteses sobre mudanças climáticas devem ser analisadas considerando-a como um fenômeno complexo, relativo, volátil e compatível com a experiência cientifica que acredita na “certeza da incerteza” (Demo, 2000) e admite a importância do princípio da incerteza e da precaução.

Observatório Eco: De que maneira é possível desmistificar a teoria negacionista das mudanças climáticas, por exemplo, do governo de Donald Trump?

Isabel Grimm: Um aspecto relevante da mudança climática, sob a ótica do aquecimento, é a abrangência global, tanto em suas causas como em suas consequências (IPCC, 2007) e, sendo uma problemática global, manifesta-se de maneira desigual nas mais diversas regiões do mundo (STERN, 2006). Países pobres deverão enfrentar as maiores consequências mesmo não sendo estes responsáveis pela maior parte de emissão de GGE.

A mudança climática poderá afetar os elementos básicos da vida no Planeta, acesso à água, produção de alimentos, saúde e meio ambiente, causando aumento de pressão sobre os recursos naturais aliados a grande urbanização, industrialização e desenvolvimento econômico.

Diante desse cenário, é imperativo a pressão global em relação as atitudes negacionistas e individualizadas de alguns países em relação as mudanças climática, pois, esse é um fenômeno global e, como tal, deverá afetar a todos, independentemente de sermos mais ou menos poluidores.

Observatório Eco: Qual a esperança que podemos ter de que organismos internacionais e governos efetivamente podem mitigar os efeitos das mudanças climáticas no Planeta?

Isabel Grimm: É preciso um maior consenso das causas dos problemas ambientais e climáticos, reconstruir a história e analisar comportamento humano perante a realidade. Isso desde múltiplas perspectivas (ética, psicológica, social, econômica, política, tecnológica etc.) relacionando as causas e conflitos ambientais com outros fenômenos, seus elos e conexões, pois as transformações que configuram a crise ambiental e climática também tem suas causas na ação humana com base em determinadas concepções filosóficas, culturais, éticas, científicas e técnicas

Assim sendo, a tomada de consciência individual e coletiva das ações de mitigação como por exemplo, o consumo consciente, pode ser um primeiro passo para esta realização. O esforço deve ser conjunto, sociedade, empresas e governo tendo como base a certeza de que não devemos continuar agindo como de costume.




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