Preocupação da empresa com a prova ambiental é maior

em 29 September, 2009


Em recente decisão, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) entendeu que cabe a inversão do ônus da prova nas ações de reparação de dano ambiental. Dessa forma, fica transferida para o empreendedor da atividade potencialmente lesiva ao meio ambiente a obrigação judicial de demonstrar a segurança do empreendimento.

 

Para o advogado Alexandre Assed, sócio do escritório Avvad, Osorio Advogados, trata-se de um leading case. Ele recomenda que, a partir de agora, as empresas passem a reunir provas de que não poluem. Porém independentemente dessa inversão, a ré “deve sempre pautar a sua atividade nas normas ambientais”, ressalta Assed. “As empresas, sobretudo aquelas com atividades continuadas, deverão se preocupar em ter provas de que estão agindo de acordo com as normas ambientais vigentes”, completa.

 

Graduado em direito pela PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), Alexandre Assed fez sua pós-graduado em Direito Ambiental pela USP (Universidade de São Paulo). Ele considera que o grande desafio do advogado ambientalista seja “fazer com que as leis peguem. Temos no Brasil esse fenômeno, das leis que pegam e outras que não pegam”.

 

Outro ponto que Assed, também professor na PUC-RJ, aponta como um entrave na advocacia ambiental é a falta de um critério legal objetivo para estabelecer a competência dos órgãos ambientais para licenciamento e fiscalização. Ele lembra que há inúmeros processos judiciais sobre a matéria, o que dificulta a vidas das empresas.  

 

Assed reforça que “as pessoas e as empresas têm que conhecer os seus direitos e deveres, saberem seus limites e, sobretudo, entenderem seu dever constitucional de defender e proteger o meio ambiente para as gerações presentes e futuras, respeitando-se a economia de mercado e o imprescindível desenvolvimento do País”.  Veja a íntegra da entrevista que Alexandre Assed concedeu ao Observatório Eco, com exclusividade. 

 

 

u    Observatório Eco: Recentes decisões do STJ (Superior Tribunal de Justiça) seguem no sentido de que se justifica a inversão do ônus da prova, em ações ambientais, transferindo para o empreendedor da atividade potencialmente lesiva o ônus de demonstrar a segurança do empreendimento. Qual o impacto desta orientação na vida das empresas? Essa tendência vai se espalhar pela Justiça? 

 

Alexandre Assed: A empresa, independentemente da inversão ou não do ônus da prova em uma ação, deve sempre pautar a sua atividade nas normas ambientais vigentes. Por sua vez, a partir dessas decisões do STJ, as empresas, sobretudo aquelas com atividades continuadas, deverão se preocupar em ter provas de que estão agindo de acordo com as normas ambientais vigentes.

 

Sem esse posicionamento do STJ, quem alegava a realização do dano, tinha que provar que o réu cometeu ilícito, agora quem está sendo acusado tem que provar que está certo. É uma mudança relevante de paradigma, que deve ser seguida pelos tribunais.

 

u    Observatório Eco: Isso facilita atuação do Ministério Público?  

 

Alexandre Assed: Certamente, uma vez que não cabe mais ao Ministério Público, legitimado para propor Ação Civil Pública, comprovar os fatos por ele alegado. A prova do dano ambiental é de difícil produção, principalmente nas hipóteses de dano histórico, em que uma determinada área sofre agressões ambientais por longo período e por diferentes agentes.

 

u    Observatório Eco: Essa inversão do ônus da prova será discutida ainda no STF (Supremo Tribunal Federal)?

 

Alexandre Assed: O posicionamento do STJ deriva de interpretação de leis federais, não cabendo, desse modo, a discussão no Supremo.

 

u    Observatório Eco: Há casos em que em determinada região produtora é difícil apontar a empresa que produziu o dano ambiental, em caso de acidente, por exemplo. Se todas as empresas do local provam que seguem regras que evitam a prática de poluição, quem será penalizado pelo dano ambiental causado?

 

Alexandre Assed: Para a exclusão da responsabilidade civil em matéria ambiental não basta que a empresa adote procedimentos de prevenção à poluição. Essa, por sinal, é uma conduta que deve ser praticada por todas as empresas. Para a empresa ser penalizada por um dano ambiental deve haver conduta, nexo causal e dano. Com essa interpretação do STJ, quem tem que provar a inexistência de qualquer desses elementos será o réu e não mais o autor.

 

u    Observatório Eco: A inversão do ônus da prova também significa que a empresa deva pagar as despesas de perícia requerida pela outra parte no processo?  

 

Alexandre Assed: Não. A parte que requerer a produção de prova pericial continua obrigada ao pagamento dessas custas. O que muda com a inversão do ônus da prova é que a parte ré precisa comprovar que sua atividade não gerou o dano alegado. Então, na maioria das vezes, será a ré quem irá requerer a produção de tal prova e, consequentemente, arcar com as despesas.

 

u    Observatório Eco: A prova de que a atividade é segura, porém causou algum dano ambiental pode diminuir a penalização da empresa?

 

Alexandre Assed: Temos que dividir nesse caso, a responsabilidade civil das responsabilidades penal e administrativa. Nos dois últimos casos, a valoração das penalidades deve ser influenciada por diversos fatores além da extensão do dano ambiental, dentre eles, a conduta da empresa para evitar e/ou restringir o dano. Já para a responsabilidade civil, o que interessa é a reparação integral do dano ambiental.

 

u    Observatório Eco: Como deve agir uma empresa que causou dano irreversível, de difícil reversibilidade ou de larga escala? É correto ela discutir por vários anos na Justiça que não deve reparar o estrago que causou?

 

Alexandre Assed: Sou sempre favorável a celebração de Termos de Ajustamento de Condutas (TAC), com a participação do Ministério Público e do órgão ambiental competente, de forma que o causador do dano se comprometa, num espaço de tempo de comum acordo e pré-estabelecido no próprio termo, deixar de causar dano ou recuperar o meio ambiente à sua forma original. A vantagem é que todos participam da negociação das exigências do TAC, ao contrário de uma decisão judicial que é imposta pelo Juiz depois de muitos anos no processo e, em muitos casos, de difícil execução.

 

u    Observatório Eco: Como a empresa pode reunir provas de que sua atividade não polui o Meio Ambiente?

 

Alexandre Assed: A prova de que a empresa não causa poluição ao meio ambiente vai variar caso a caso, de acordo com a atividade exercida pela mesma. A principal preocupação é a comprovação através de documentos do cumprimento das exigências previstas na licença ambiental.

 

u    Observatório Eco: Cite 3 pontos ainda nebulosos da jurisprudência ao discutir temas ambientais.

 

Alexandre Assed: Há muitos temas ainda para serem discutidos, já que a matéria é muito nova e a inclusão definitiva das questões ambientais na pauta dos grandes problemas mundiais é recente. Como valorar o dano ambiental, bem como os limites razoáveis para o estabelecimento de condicionantes e para o valor da compensação ambiental são temas muito discutidos em diversos processos judiciais.

 

u    Observatório Eco: Quais as leis ambientais que auxiliam o desenvolvimento sustentável das empresas?

 

Alexandre Assed: Diversas leis visam o desenvolvimento sustentável das empresas. A lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, foi recepcionada pela Constituição de 1988 e é aplicada sem restrições até hoje, inclusive no que tange à responsabilidade civil objetiva do poluidor pelos danos ambientais. Inclusive, a interpretação que gerou a questão da inversão do ônus da prova deriva também dos dispositivos dessa lei.

 

Outra lei importante é a 9.433/1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos. Ela cria os instrumentos de proteção de um dos nossos bens mais importantes, que é a água. Estabelece a cobrança pelo uso dos recursos hídricos e a necessidade de outorga para tanto.

 

Também muito importante é a lei 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. Esse diploma que cria o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza unificou diversas normas esparsas e regulamentou a questão das unidades de conservação no País. É fundamental para proteção de diversos ecossistemas e também para que todos saibam os limites para sua atuação e de proteção, sobretudo em áreas de interesse ambiental.

 

u    Observatório Eco: Quais as leis ambientais que dificultam o desenvolvimento sustentável das empresas?

 

Alexandre Assed: A falta de um critério legal objetivo para estabelecer a competência dos órgãos ambientais para licenciamento e fiscalização é um dos maiores problemas para as empresas, que precisam saber a quem responder.  Há inúmeros processos judiciais sobre a matéria.

 

u    Observatório Eco: Qual o desafio do advogado ambientalista no Brasil?

 

Alexandre Assed: Fazer com que as leis peguem. Temos no Brasil esse fenômeno, das leis que pegam e outras que não pegam, e o trabalho dos advogados é muito importante nesse sentido. No caso do ordenamento jurídico ambiental, temos um arcabouço legislativo moderníssimo e tribunais superiores com decisões bastante avançadas sobre a matéria. As pessoas e as empresas têm que conhecer os seus direitos e deveres, saberem seus limites e, sobretudo, entenderem seu dever constitucional de defender e proteger o meio ambiente para as gerações presentes e futuras, respeitando-se a economia de mercado e o imprescindível desenvolvimento do País. 




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