Especialistas criticam o projeto do Código Florestal

em 26 May, 2011


O Plenário da Câmara Federal aprovou o projeto de lei 1.876/99, que pode revogar o Código Florestal, lei federal 4.771/65. A proposta votada pelos deputados inova em muitos aspectos a legislação florestal. Por exemplo, passa a permitir o uso das APPs (áreas de preservação permanente) já ocupadas com atividades agrossilvipastoris, ecoturismo e turismo rural. Outro ponto polêmico é quando trata da reserva legal, e concede isenção da averbação para pequenos proprietários – até quatro módulos fiscais. O texto também confirma a anistia e isenta de multas os proprietários que cometeram infrações ambientais até 22 de julho de 2008.  

Além disso, o projeto dá aos Estados, por meio do PRA (Programa de Regularização Ambiental), o poder de estabelecer outras atividades que possam justificar a regularização de áreas desmatadas.

Na avaliação do presidente do Instituto O Direito por um Planeta Verde, Carlos Teodoro Irigaray, esta permissão pode implicar maior prejuízo e significativo incremento no desmatamento. “Por ser o Parlamento estadual mais suscetível à pressão de setores interessados em ajustarem as leis às suas necessidades, é induvidoso que os deputados estaduais usarão ao máximo sua criatividade para excluir as hipóteses de recuperação de áreas convertidas irregularmente”, disse Irigaray à reportagem do Observatório Eco.

No entendimento do advogado e jurista, Celso Antonio Pacheco Fiorillo existe exagero quando o tema é Código Florestal. Para ele,  a lei  4.771/65  é “tão somente” mais uma lei federal vinculada “à tutela jurídica do meio ambiente natural, vez que outras legislações de importância permanecem em vigor”.  Além disso, ele ressalta que o projeto aprovado na Câmara e caso venha as ser aprovado no Senado Federal também  terá que se “curvar ao direito ambiental constitucional”.  

Segundo Fiorillo, o meio ambiente está protegido por dezenas de outras legislações que permanecem em vigor, como por exemplo, a lei 11.284/2006 que dispõe sobre a gestão das florestas públicas para a produção sustentável; a lei 11.428/2006 que trata da utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica. Para o especialista, inclusive a lei 9.985/2000 é importantíssima, “vez que regulamenta o art.225 da Constituição Federal, o parágrafo primeiro incisos I, II, III e VII, e institui o SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza)”.

Texto ruim

Para o advogado Bruno Morais Alves, que atua em Brasília,  “o texto aprovado é de baixa qualidade, sem nenhuma base científica, pautado exclusivamente em interesses econômicos privado de curto prazo”. E completa, “o debate político foi feito de forma canhestra onde se ignorou o óbvio. Não condiz com o mundo pós-moderno em que o Brasil está inserido, e mostra um claro retrocesso na legislação ambiental brasileira”, conforme afirmou em artigo exclusivo feito para o Observatório Eco.

Vladimir Garcia Magalhães, jurista e professor, também critica a falta de maior participação na discussão sobre o Código Florestal da comunidade científica brasileira “séria e mais habilitada a analisar e explicar os impactos ambientais decorrente da aprovação deste PL e suas consequências desastrosas a longo prazo para o equilíbrio ecológico do meio ambiente no Brasil, para a justiça social e mesmo para a economia brasileira”.

Para o promotor de justiça do Rio Grande do Sul, Daniel Martini, a redação da proposta aprovada na Câmara “é repleta de embustes, engodos, lacunas propositais para perpetuar e – diria – legalizar a fraude, a burla à lei. Incentiva a cultura de desrespeito à legislação, com garantia da impunidade”.  “Diminui a proteção ambiental e é um retrocesso”, completa.

O texto aprovado é incompatível “com os objetivos da política nacional do meio ambiente e com os compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito internacional, por exemplo, os compromissos relacionados às mudanças climáticas”, avalia Martini.

APPs

Carlos Teodoro Irigaray e Valdimir Magalhães destacam que o tratamento dado pelo projeto às APPs (áreas de preservação permanente) é desastroso. “É inaceitável a possibilidade de regularização das APPs já ocupadas com atividades agrossilvipastoris, o que subverte completamente o sentido da preservação permanente e a função ecológica dessas áreas, premiando os que optaram pela prática de crimes em detrimento dos que cumpriram a lei”, alerta Irigaray.

Magalhães também traz outro alerta, da forma como trata as APPs esse projeto implica  “no  aumento da destruição florestal nas atuais APP”. “Vai comprometer os recursos hídricos brasileiros pelo aumento da destruição das matas ciliares à beira dos rios e demais corpos hídricos aumentando a erosão do solo pelas chuvas e assoreamento dos rios”, completa.

O projeto de lei 1.876/99, ainda será votado no Senado Federal e com um debate mais amplo, talvez os pontos polêmicos possam ser retirados desta proposta. “Vamos aguardar então se o projeto vai se transformar em lei e como será a nova lei. De qualquer forma, o Poder Judiciário saberá interpretar de forma equilibrada, absoluta e definitiva nosso futuro Código Florestal”, avalia Celso Fiorillo.




3 Comentarios

  1. claudio, 12 anos atrás

    Um comentário feito acima é esclarecedor para este assunto e outros: os que cumpriram a lei estão sendo, mais uma vez, achincalhados; e os que a descumpriram estão sendo beneficiados aos invés de penalizados. É o Brasil de sempre…

  2. D GOMES, 12 anos atrás

    Em razão de notícias equivocadas acerca do novo Código Florestal, aprovado pela Câmara dos Deputados, na noite de 24/05/11, faz-se necessário apresentar esclarecimentos sobre a redação das emendas n. 186 e n. 164, que formam o seu texto base.

    1) Não haverá autorizações para desmatamentos em áreas de preservação permanente
    O texto aprovado pelo Plenário da Câmara dos Deputados não permite qualquer desmatamento em áreas de preservação permanente. No dispositivo que trata do tema (art. 8º), a redação conferida pelo destaque aprovado (emenda n. 164) expressamente determina que é “vedada a expansão das áreas ocupadas” (§ 4º), ou seja, não poderá haver qualquer supressão de vegetação em área de preservação permanente para a implantação de novas atividades agrícolas.

    2) As atividades já consolidadas em áreas de preservação permanente não serão automaticamente mantidas
    Também não encontra respaldo a afirmação de que o texto aprovado libera automática e definitivamente a continuidade de toda e qualquer atividade agrícola realizada em área considerada de preservação permanente.
    Três são as hipóteses que autorizarão a intervenção ou supressão de vegetação em área de preservação permanente e a manutenção de atividades consolidadas até 22 de julho de 2008:

  3. Mauricio Alves, 12 anos atrás

    A única coisa concernente ao assunto, e que nos salta aos olhos é a nossa fantástica ignorância.
    Sem cultura, do conhecimento, do saber e da agricultura, lamentavelmente, não iremos a lugar nenhum.
    Nem cientistas não nos bastam, porque não têm cacoete da observação. Esse fator nos é, simplesmente, demonstrados pela perfeita integração dos silvícolas…
    Não se pode em gabinentes refrigerados ditar normas aleatórias.
    Urge, antes de mais nada, educar nosso povo, que está por demais provado ser bom. Em verdade, o que nos estraga é esse monturo, que constituem nossos dirigentes dos Três Poderes.
    Inverteram-se os papeis, porquanto não são os agricultores de encostas e topos de morros que causam destruição ao ambiente. Aliás, há milênios chineses, portugueses, peruanos, além de muitos outros povos, cultivam em suas montanhas em forma de tabuleiros… Não ocorre voçoroca em cafezais plantados nas montanhas de Minas Gerais ou do Espírito Santo, facilmente constatado.
    O que nos horroriza não são as moto-serras, mas os arrastões amazônicos, promovidos com correntes gigantescas tracionadas por tratorres de esteiras mastodônicos.
    Os males do País esbarram aí, na “cultura da pobreza”.
    Eis um bom negócio, conveniente à manutenção do status, muito bem ProTagonizado, até agora.


Deixe um comentário